“Cara de empregada doméstica”
Discursos sobre os corpos de mulheres negras no Brasil
DOI:
https://doi.org/10.18861/ic.2025.20.2.4110Palavras-chave:
ideologia, contradição social, racismo, resistência, subjetivaçãoResumo
O trabalho analisa a construção discursiva dos estereótipos de mulheres negras no Brasil, com foco na discriminação da figura da empregada doméstica a partir do modo como é significado seu corpo. Com base na teoria da Análise de Discurso, filiada às pesquisas que têm como principal autor Michel Pêcheux (1975; 1983), em diálogo com a produção teórica da feminista negra Lélia Gonzalez (1983), analisamos um corpus composto por textos veiculados nos meios de comunicação brasileiros em torno de duas polêmicas com repercussão significativa em 2013: a aprovação da emenda constitucional EMC 72-2013, apelidada “PEC das empregadas domésticas”, projeto que estendeu aos empregados domésticos direitos já garantidos aos demais trabalhadores formais no país, e o programa federal “Mais Médicos”, que tem como objetivo contratar médicos para atuarem em cidades com carência no serviço básico de saúde. O enunciado que provoca as análises foi a declaração nas redes sociais de uma jornalista sobre o programa “Mais Médicos”: "Me perdoem se for preconceito, mas essas médicas cubanas têm uma cara de empregada doméstica. Será que são médicas mesmo?". Perguntamo-nos sobre como são construídos historicamente os sentidos para a designação “cara de empregada doméstica”, percorrendo redes de memórias em que os corpos das mulheres negras são significados (e disputados em seus sentidos) nos discursos da escravidão e da colonização, da construção da identidade nacional sustentada no mito da democracia racial e dos movimentos sociais contemporâneos de mulheres negras. Considerando que a luta ideológica se dá também no terreno da linguagem, disputando os significantes e produzindo regimes de visibilidade, analisamos também os deslocamentos e equívocos que afetam essa designação nas condições de produção e circulação dos discursos sobre “empregadas domésticas” no espaço público e político brasileiro.
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